14 de novembro de 2015

O vizinho

Tive alguma dificuldade em entender a minha irmãzinha de nove anos e todos os seus protestos acerca  de determinados assuntos. Hoje, consigo entendê-la na perfeição, devia ser ao contrário, eu a ensinar-lhe alguma coisa nova, como um exemplo a seguir, um bom irmão mais velho. Nesta situação foi ela quem me ensinou.
Vou então começar pelo início, há  uns meses, mudou-se para a casa ao lado um senhor com os seus 65 anos. Nada de novo, pensava eu, quantas vezes não vemos pessoas a mudar de casa, sinceramente nem tinha reparado nele, nem eu nem a minha mãe. A minha irmã, por outro lado, reparou naquele velhote solitário, na sua tristeza, na mágoa nos seus olhos, na amargura quando falava e, por fim, reparou que ninguém o visitara uma única vez. Podia ser um velhote triste, mas esforçava-se sempre para sorrir, muito simpático e educado. Tudo começou quando a minha irmã ganhou empatia pelo senhor, gostava de ir para o quintal brincar para o observar. Ela nunca tentara aproximar-se dele, pois a minha mãe fê-la prometer que nunca iria aproximar-se de um estranho.

Até que um dia ela decidiu falar no assunto, estávamos todos sentados à mesa, faltava precisamente um mês para o Natal. Disse-nos que tinha observado o seu futuro amigo todos aqueles meses e que o queria ajudar porque sabia que ele era uma pessoa triste e sozinha, que não tinha companhia e que iria passar o Natal sozinho. A minha mãe decidiu desviar o assunto, dizendo que iria pensar numa alternativa para o ajudar, pois sempre teve muito medo de estranhos. A minha irmã, que sabia que quando ela dizia isso nunca mais iriam tocar no assunto, começou a chorar. O meu pai pegou-lhe ao colo e prometeu-lhe que iria ter uma conversa com a minha mãe e que iriam decidir o que fazer. Na altura pensei que fosse uma birra habitual, que acontece a todas as crianças, mas hoje vejo que não.

Fui para o quarto e um pouco depois ela bateu à porta para me pedir apoio para convencer a mãe e o pai a ajudar o nosso vizinho. Perguntei-lhe o porquê de tanta urgência no assunto, o porquê de tanta compaixão para com uma pessoa que ela não conhecia. E foi nesse momento
  que ela me surpreendeu e me ensinou umas quantas coisas. Disse-me que não devemos apenas ter amor e compaixão pelos membros da nossa família e amigos, as outras pessoas também têm sentimentos e merecem ser amadas e respeitadas, merecem sorrir, ter amigos, ter alguém com quem partilhar a sua felicidade, o natal, as prendas, o amor, a entre ajuda, o respeito. Disse-me ainda que devemos pôr-nos no lugar dos outros, porque nunca se sabe quando seremos nós naquela situação ou em situações ainda piores. Fiquei de boca aberta e perguntei-lhe ainda como é que ela tinha chegado a todas aquelas conclusões sozinha, e ela disse-me:

- Mano, não cheguei a nada sozinha, cá em casa todos vocês sempre me ensinaram que devemos ajudar os outros para tornar o mundo melhor, pena é que não o ponham em prática. Não podemos dizer aos outros o que fazer se nós próprios o fizermos! Por favor, ajuda-me a tornar o sorriso daquele senhor verdadeiro. Gostava muito que ele pudesse passar o Natal connosco, sei que ele gosta muito de flores, podemos fazer-lhe um jardim no quintal e ir buscar um cão ao canil para lhe fazer companhia, o que achas? 

Estava mesmo de boca aberta sem saber o que dizer, a minha irmãzinha tinha-me ensinado uma lição daquelas que todos devemos ter em mente. Prometi-lhe que íamos tornar o seu sonho realidade e fui falar com os meus pais e contei-lhes a nossa conversa.

Hoje, dia de Natal, não podia estar mais alegre. Tenho a família toda reunida cá em casa, temos um novo amigo, o senhor João (o nosso vizinho
), e a minha irmã sorri como nunca a tinha visto sorrir. Ao senhor João, sempre lhe oferecemos o cão e as flores e plantas para podemos todos em conjunto fazer o seu jardim e agora este sorri genuinamente. A minha irmã não podia estar mais feliz, diz que o realizar deste sonho foi a melhor prenda deste Natal.
          
Percebi, então, que o melhor da vida está em quem nos faz bem, está no nosso coração e em como vemos e interpretarmos as coisas. E aprendi também que não são só os mais velhos que nos podem ensinar algo de bom, as crianças também têm muito para dar, principalmente bondade, por isso, devem ser sempre ouvidas.


Carolina Figueiras

6 comentários:

  1. O texto que escreveste diz o que nós aprendemos em teoria, mas quase nunca ou nunca colocamos em prática. Cada vez escreves melhor!! ❤

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  2. Muito bom, parabéns.
    Vou continuar a seguir o teu blog.

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  3. Muito obrigada Alexya, é bem verdade. Obrigada pelo teu apoio é muito importante para mim!

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  4. A personalidade consolida pela experiência e interação com o meio!
    Verifico, mais do que nunca, existirem realidades muito semelhantes que por comodismo ignoramos! Todos sabemos com probabilidade que um dia poderá ser esta a nossa própria história!...
    Parabéns pela coragem, sensibilidade e determinação aqui expressas.

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    1. Obrigada pelo apoio.
      Ainda bem que gostas-te!
      Espero continuar sempre a escrever algo que gostes de ler!

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